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Pequenas curiosidades sobre o vinho

  • por, Carlos H. Coimbra
  • 8 de fev. de 2018
  • 6 min de leitura

Há décadas atrás, os antigos livros de história contavam que a cerveja foi a primeira bebida fermentada produzida por humanos. Dizia-se que foi no Egito, há uns quatro mil anos.

A informação acima já está ultrapassada.

Os novos livros de história provavelmente contarão que foi o vinho, e não a cerveja, a bebida fermentada mais antiga. Achados arqueológicos dos últimos dez anos têm confirmado isso.

Abaixo, algumas curiosidades, poucas para dizer a verdade, a serem complementadas com livros e, logicamente, a apreciação ao vivo, com moderação.

Curiosidade 1: Arqueologia do vinho

Segundo essas pesquisas, a fermentação do suco do fruto da videira foi provavelmente primeiramente obtida no que hoje é a Geórgia, país do leste europeu. Os primeiros vinhos foram feitos há oito mil anos em vilas neolíticas ao sul do Cáucaso (região de Tbilisi, local que no tempo de Heródoto ficava entre a Armênia e a Sarmátia). Também já foram encontrados traços de vinho de uva misturado a vinho de arroz em escavações na China (região de Jiahu) datadas de nove mil anos atrás.

Até hoje a Geórgia produz vinhos utilizando o método tradicional de fermentação em potes de cerâmica. São potes imensos denominados “Kvevri”. O vinho é fermentado dentro do jarro que é depositado abaixo do solo em um buraco. Você pode encontrar vinhos de Kvevri na internet ou em lojas especializadas (é difícil, mas vale a pena).

Curiosidade 2: A obsessão romana pelo vinho

Na antiguidade, beber vinho era praticamente uma regra nos países do Mediterrâneo, cujo clima favorecia e favorece a lavoura da vitis vinifera. No entanto, o costume era bebê-lo misturado a água e a mel. Algumas colônias gregas foram fundadas ao sul da Itália (Magna Graecia) a partir do século oitavo antes de Cristo. Algumas vezes a Magna Graecia era apelidada de “terra do vinho”, por ter produções de excelente qualidade. Mais tarde, os patrícios do Império Romano se tornaram tão fissurados em beber vinho, que as terras da Itália se tornaram saturadas na monocultura de vitis vinifera, gerando uma crise agrícola e alimentar.

Curiosidade 3: Monges católicos inventaram o vinho moderno

Sem a igreja católica provavelmente não haveria o vinho moderno. Isso porque na Idade Média era necessário vinificar para obter o vinho da missa. Naquela época, muitas técnicas antigas foram perdidas e os monges precisaram experimentar. E, da tentativa e erros, dos claustros alemães nasceram os grandiosos vinhos brancos Riesling e a base para as técnicas modernas de vinificação.

Curiosidade 4: Vinho fino x vinho de mesa

No Brasil, os vinhos são classificados como “vinhos finos” ou “vinhos de mesa”. Os vinhos finos são feitos com uvas viníferas europeias clássicas (vitis vinifera), como a Cabernet Sauvignon e a Merlot, e os vinhos de mesa (que o povo aqui do sul chama de vinho colonial) são geralmente feitos com uvas americanas, como a Isabel e a Bordô. Os vinhos finos, quando adequadamente vinificados, geralmente têm uma estrutura mais complexa que os vinhos de mesa.

Curiosidade 5: A classificação dos vinhos é multidimensional

Há vinhos tintos, rosés, brancos e mesmo âmbar (especialidade da Geórgia e algumas regiões da Itália). Há vinhos secos (quando o açúcar é completamente consumido na fermentação), há vinhos doces (quando as uvas têm um teor acentuado de açúcar, como é o caso daquelas de colheita tardia ou “botritizadas” por um fungo, como é o caso das uvas Furmint que são a base do Tokaji húngaro, ou quando a fermentação não é levada até o fim), há vinhos adocicados (os tais suaves, em que é acrescentado açúcar e geralmente no Brasil fazem parte dos vinhos de mesa), há os vinhos fortificados (em que é adicionada aguardente de uva ou outro tipo de destilado; estes possuem alto teor alcoólico), há os vinhos tranquilos, os vinhos frisantes e os vinhos espumantes (os últimos dois têm borbulhas de gás carbônico decorrentes do processo de fermentação). As uvas vitis vinifera tintas não são somente as Cabernet ou a Merlot. Há uma infinidade: Teroldego, Tinta Roriz, Refosco, Nebbiolo, Syrah, Pinot Noir, Castelão, Tsolikouri, Tannat e por aí vai, cada uma com suas características de acidez, corpo e taninos. Já as brancas viníferas, também as há além da famosa Chardonnay: Furmint, Torrontés, Chenin Blanc, Bical, entre outras.

Vinhos em geral podem ser classificados pelo tipo de uva de que são feitos (se há apenas uma, vinhos varietais, se há uma mistura, vinhos de corte, ou assemblage), mas principalmente pela região de origem ou mesmo subregiões de procedência. Haverá os Bourgogne, mas também os Romanée-Conti que se encontram dentro da Bourgogne na França. E há a classificação geral dos vinhos feitos na Europa (classificados como “Velho Mundo”) e os feitos nas Américas, China, Oceania ou África do Sul (classificados como “Novo Mundo”).

Curiosidade 6: Vinho é elitista, mas não deveria

No mundo há movimentos para dar uma maior naturalidade ao vinho, desassociando-o daquela velha pecha de “bebida chique”, “bebida para poucos”, “bebida das elites”. É lógico que não há como fugir dessa associação nos dias de hoje. Em lugares como Europa ou Austrália, o vinho tem lugar comum como bebida do povo. Mas em países como o Brasil, o vinho é realmente tido como uma bebida elitista. Isso pode ser explicado de muitas formas, mas uma delas é a de que na época colonial os estudantes brasileiros da elite se deslocavam para Coimbra ou Paris e voltavam bebendo vinho e vangloriando a cultura europeia. Um movimento cultural nacional de resistência a isso nasceu para varrer esse aspecto elitista de valorização do alienígena sobre o nacional, iluminando as cantigas e a arte brasileiras e a bebida nacional do povo, a cachaça.

Curiosidade 7: O paradoxo francês

Pesquisas médicas sugerem que a grande concentração de uma determinada substância no vinho tinto, o resveratrol, poderia prevenir problemas cardíacos e de circulação sanguínea, além de ser um antioxidante natural. Há décadas atrás uma investigação científica constatou que apesar de se alimentar de comidas muito gordurosas e de fumarem muito, os franceses viviam mais e melhor que os estadunidenses. A explicação era que apesar dos excessos, os franceses bebiam vinho tinto de forma mais regular que os norte-americanos. A pesquisa também constatou que a longevidade só era alcançada nos casos em que se bebia uma dose limitada de vinho (no máximo duas taças por dia). Acima desta dose, o vinho na verdade parecia ter um efeito inverso, causando desde quadros graves de câncer a outras doenças, principalmente no sistema digestivo e no fígado.

Curiosidade 8: O pequeno produtor

Jonathan Nossiter, diretor dos filmes “Mondovino” e “Natural Resistance”, tem atuado mundialmente junto a outros grupos no sentido de valorizar a pequena produção, o formato orgânico de vinhedo, vinhos bionaturais e a crítica ao lobby de grandes companhias ou instituições que promovam a pontuação oficial de rótulos de forma pouco transparente. A vantagem do pequeno produtor vem da qualidade do vinho, da valorização das característica próprias do solo (o chamado terroir) e da valorização social de agricultores que valorizem a qualidade sobre a quantidade ou sobre o lucro desarrazoado.

Curiosidade 9: Vinhos brasileiros

Por incrível que pareça, o Brasil é destaque internacional em alguns tipos de vinhos, principalmente os espumantes. Diz-se que muitos espumantes brasileiros competem de igual para igual com os caríssimos Champagne (espumante produzido na região de mesmo nome, na França). Mas também os vinhos brancos e tintos brasileiros estão crescendo em qualidade.

Há anos um grande conhecedor de vinhos do mundo, o inglês Steven Spurrier, que organizou em 1976 o famoso Julgamento de Paris, expondo ao mundo que os vinhos produzidos nos Estados Unidos eram tão bons quanto os franceses, vem visitando o Brasil e destacando que nosso país será a próxima grande descoberta dos vinhos mundiais.

O Brasil possui alguns locais muito propícios para o cultivo e vinificação da vitis vinifera. Os principais destaques são o Vale dos Vinhedos, pontos da Serra Gaúcha e a região fronteiriça com o Uruguai, no Rio Grande do Sul. Mas há também grandes surpresas como os vinhos feitos nos arredores de São Joaquim ou no Vale do Contestado, Santa Catarina. Pontos da Serra da Mantiqueira (fronteira de Minas com São Paulo) e Vale do São Francisco (Bahia e Pernambuco) também se destacam. Em particular, os vinhos feitos no Nordeste brasileiro, Vale do São Francisco, são muito peculiares e provavelmente os únicos do mundo produzidos em latitudes próximas ao Equador.

Carlos H. Coimbra (twitter: @carloscoimbra9) é professor e cientista da Universidade Federal do Paraná. Gosta de dar pitacos sobre ciências e cultura geral.

 
 
 

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De bebedor de cerveja a APRECIADOR DE VINHOS. Após morar quase 2 anos em Luanda/Angola, tive oportunidade de conhecer os paladares e nuances envolvendo o mundo dos vinhos.

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